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Impacto de 0,054% em reserva indígena impede avanço de ferrovia de mil quilômetros

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Impacto de 0,054% em reserva indígena impede avanço de ferrovia
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O Supremo Tribunal Federal (STF) pode decidir nesta semana se mantém o embargo ou libera os encaminhamentos de uma das principais obras de logística do país. Em pauta, a constitucionalidade da Lei 13.452/2017 que alterou em 0,054% os limites do Parque Nacional do Jamanxim, no Pará, e autorizou o avanço dos estudos e projetos para construção da ferrovia Ferrogrão.

Essa autorização foi sustada em 2021 em liminar concedida pelo ministro Alexandre de Moraes ao PSOL, que alegou potenciais danos ao meio ambiente e às comunidades indígenas.

À época, Moraes não atendeu manifestações do Senado, da Câmara dos Deputados, da Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República, todos se posicionando pela improcedência do pedido do PSOL e, no caso do Parlamento, atestando que a conversão da Medida Provisória 758/2016 em lei foi feita dentro dos trâmites constitucionais e regimentais.

A ferrovia de 933 quilômetros vai ligar Sinop, no Mato Grosso, ao complexo portuário do rio Tapajós em Miritituba, no Pará, escoando de forma mais barata e eficiente as colheitas da faixa norte do cinturão verde do Centro-Oeste brasileiro, uma das áreas mais produtivas de soja e milho do mundo.

O PSOL e ambientalistas são contra a ferrovia pelo fato de que ela percorrerá um trecho de 53 km da borda de uma reserva indígena, exigindo o uso de 862 hectares para leito e faixa de domínio dos trilhos.

É essa faixa, que corresponde a 0,054% do total do parque do Jamanxim, e que corre em paralelo ao traçado da BR-163, a rodovia Cuiabá-Santarém, que tem impedido o sinal verde para o projeto. Trata-se de área já desmatada, ao longo de uma estrada que já existia muito antes da criação do parque nacional, em 2006.

Balanço ambiental da ferrovia é reconhecidamente positivo

Em defesa da constitucionalidade da Lei 13.452/2017 , a Procuradoria-Geral da República (PGR) argumentou que a Ferrogrão, além de “reduzir a emissão de poluentes originados pela circulação de caminhões de transporte de cargas, não viola, mas, ao contrário, concretiza o princípio do desenvolvimento sustentável”

“Não se visualiza prejuízo ambiental relevante ocasionado pela pequena redução da área de proteção ambiental em relação ao desenvolvimento econômico proporcionado pela construção da ferrovia”, sustenta a PGR.

Assim, apesar de haver jurisprudência no STF de que a Constituição veda alteração de espaços territoriais especialmente protegidos por meio de Medida Provisória, mesmo que depois convertida em lei, neste caso a leitura não se aplicaria, porque a finalidade do dispositivo constitucional é “assegurar o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”, o que estaria assegurado pelos benefícios da obra.

Durante o governo Bolsonaro, a Advocacia-Geral da União (AGU) tinha se manifestado contrária ao pedido do PSOL, e, portanto, favorável à constitucionalidade da lei de 2017. Agora, depois de instada a se manifestar contra o empreendimento pela ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, a AGU se alinhou aos argumentos do partido de esquerda. E passou a afirmar que “houve diminuição de área de proteção integral em unidade de conservação ambiental – a qual acarreta, na prática, a redução da proteção ao meio ambiente”.

Ferrovia vai mitigar tráfego de caminhões e poluição

A AGU disse, contudo, ser favorável à continuidade dos estudos técnicos. E reconheceu o benefício da ferrovia. “Sem embargo de toda a exposição anterior, cabe apenas reiterar que o entendimento ora exposto não traduz, como dito, de forma alguma, posicionamento institucional no sentido de que a implantação da estrada de ferro EF-170, por si só considerada, seria lesiva ao meio ambiente”, diz o parecer.

“De fato, quando concluída, e desde que observados todos os requisitos ambientais, a Ferrogrão significará elevada capacidade de transporte e competitividade no escoamento da produção pelo Arco Norte, papel esse que, atualmente, é realizado pela BR-163, possibilitando inclusive mitigar o tráfego de caminhões naquela rodovia, proporcionando menor emissão de gases de efeito estufa decorrentes desse tráfego”, prossegue a AGU.

Pelos cálculos da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Brasil (Aprosoja), uma safra de 15 milhões de toneladas já justificaria a construção da Ferrogrão. O Mato Grosso, contudo, já produz 90 milhões de toneladas de milho e soja, sem contar a produção de carne bovina, de aves e suínos.

“Pela produção da região, se fosse tudo pela ferrovia, ela já nasceria estrangulada. Da região de Mutum para cima são 40 milhões de toneladas de grãos. Hoje já temos a ferrovia Norte-Sul, que carrega lá em Rondonópolis, até Santos. De 70% a 80% da produção com certeza iria para a ferrovia”, afirma Antonio Galvan, presidente da Aprosoja.

Custo-benefício não se compara à usina de Belo Monte

Os críticos da ferrovia têm comparado o custo-benefício da obra à usina hidrelétrica de Belo Monte, por supostamente causar um grande impacto às comunidades indígenas em troca de pouca geração de energia. Nesse ponto, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) diz que a comparação não faz sentido.

“Primeiro, o impacto é pequeno nas comunidades, apesar de ocorrer, e, segundo, é indiscutível a melhoria de eficiência que a ferrovia vai trazer. O que ela vai significar em termos de oferta de serviços e eficiência de logística é um benefício gigantesco. Nesse sentido nem dá para comparar uma coisa da outra”, assegura André Nassar, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove).

Quanto aos impactos ambientais, Nassar enfatiza que eles são inegavelmente positivos. “Porque vai trocar caminhão por ferrovia, então do ponto de vista de emissão e de eficiência energética, não tem o que discutir. Você vai tirar um modal que não é apropriado para carregar grandes volumes de granel e vai colocar um modal que é totalmente apropriado para isso”, afirma.

Por cortar o bioma amazônico, a Abiove aponta que a construção da ferrovia estará sujeita a alta exposição e vigilância. Além disso, os principais usuários serão os exportadores, a indústria da soja, que já praticam uma série de medidas preventivas e de compliance para assegurar que seus produtos não vêm de áreas de desmatamento, não têm ligação com trabalho escravo, nem impacto sobre comunidades indígenas ou violação de qualquer outro direito.

Corredor logístico não interessa a competidores

A associação dos produtores de soja diz que o jogo jogado pelo PSOL e ambientalistas serve aos interesses dos competidores do Brasil, que gostariam de congelar o agronegócio do país.

“O grande problema nosso é com brasileiros que compram essas ideias malucas dos europeus, e vêm nos atrapalhar. Como eu disse lá em Bruxelas, em 2018: quem são vocês para querer falar do Brasil ou do Mato Grosso na questão ambiental? Vamos instituir aqui a lei ambiental brasileira para ver se vocês aceitam aqui na Europa?”, afirma Galvan.

O líder agropecuarista diz, contudo, que não vê como a obra ficar indefinidamente embargada. “Eles querem boicotar a gente, mas não vão conseguir. Podem atrasar, vamos perder dois, três anos, mas vai acabar saindo. O próprio STF já tem consciência de que pode até barrar por causa dessa MP, mas é questão de ser aprovado outro projeto de lei e automaticamente reapresentamos a proposta. Isso traz prejuízo sempre para o mais fraco, o mais pobre, para quem o produto poderia chegar bem mais barato, com um modal de transporte mais barato”, assegura.

O colunista da Gazeta do Povo José Roberto Guzzo afirmou, em 2021, que o que o PSOL e agregados estão fazendo contra a Ferrogrão é crime, uma agressão contra o Brasil e os brasileiros. A exclusão de uma porção mínima da reserva indígena, os tais 0,054%, foi decidida por lei do Congresso Nacional.

“Não há absolutamente nada de errado com a medida, salvo uma coisa: o PSOL é contra e, como já se tornou prática comum no Brasil, toda vez que a extrema esquerda perde uma votação na Câmara ou no Senado, seus militantes recorrem ao STF para virar a mesa. Levam quase todas”, escreveu Guzzo. Em comparação, enquanto o Brasil leva anos debatendo o licenciamento de uma ferrovia de 933 km, a China constrói, anualmente, 4 mil quilômetros de novas ferrovias, metade delas para trens de alta velocidade.

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