A decisão do Banco Central de manter a taxa básica de juros em 13,75% e o comunicado divulgado após a reunião frustraram expectativas no governo. Em meio à queda da inflação e também das expectativas do mercado para os índices de preços deste e dos próximos anos, o Comitê de Política Monetária (Copom) não deu qualquer sinalização sobre o início dos cortes na Selic, que está nesse patamar desde agosto de 2022.
Na nota divulgada na noite de quarta-feira (21), o Copom afirmou que o cenário atual é caracterizado “por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento e por expectativas de inflação desancoradas”, e que segue demandando “cautela e parcimônia”. Segundo o comunicado, os futuros passos da política monetária dependerão:
- da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica;
- das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo;
- das projeções de inflação do próprio comitê;
- do hiato do produto (a diferença entre o quanto o país pode crescer sem gerar inflação e o quanto ele está efetivamente crescendo); e
- do balanço de riscos.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a disparar contra Roberto Campos Neto, que chefia o Banco Central. Em Roma, Lula reiterou suas críticas em relação à condução da política monetária e disse que o presidente do BC joga contra a economia brasileira. “Não existe explicação aceitável para que a taxa de juros esteja em 13,75%. Não temos inflação de demanda no Brasil.”
Falando sob anonimato com a imprensa, integrantes da equipe econômica classificaram a nota do Copom como “horrorosa e inacreditável” e até mesmo como um sinal de confronto do Banco Central.
Afirmaram que a decisão de não dar qualquer sinalização para o início de um ciclo de quedas da Selic “força a mão” e mostra um descolamento da diretoria do BC em relação ao cenário econômico e aos esforços para aprovar o novo arcabouço fiscal.
A avaliação é de que o comunicado se afastou até das leituras mais conservadoras do mercado. As expetativas de bancos e consultorias coletadas pelo próprio BC apontam para o início do corte dos juros em agosto, na próxima reunião do Copom, com uma queda de 0,25 ponto porcentual.
O novo marco fiscal foi aprovado pelo Senado nesta quarta por 57 votos contra 17. Mas, por ter sido modificado pelos senadores, o texto passará novamente pelo crivo da Câmara, provavelmente no início de julho.
Como o mercado financeiro viu a decisão e a nota do BC sobre a Selic
A reação do mercado financeiro à decisão e à nota do Copom foi bem mais amena que a do governo.
“O comunicado buscou conter um excesso de otimismo do mercado com relação à trajetória de queda da Selic”, diz Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe da Warren Rena.
Alguns bancos já começam a ver um cenário para corte dos juros só em setembro. “Embora os dados de inflação tenham evoluído de maneira mais favorável desde a última reunião, o Copom trouxe poucos elementos que indiquem início iminente do ciclo de redução de juros”, aponta relatório do Bradesco.
“Acreditamos que o comitê não indicou uma saída iminente da estratégia de manter a taxa de juros no patamar atual (ou seja, um corte em agosto). Ainda esperamos que o Copom inicie o ciclo de flexibilização na reunião de setembro”, diz o Itaú.
O economista-chefe da XP Investimentos, Caio Megale, avalia que os passos futuros da política monetária dependerão de novos dados econômicos. “Acreditamos que a estratégia do Copom é manter as taxas estáveis por mais algum tempo ou iniciar um afrouxamento monetário gradual em breve”, diz.
Para o head de research da Genial Investimentos, Eduardo Nishio, o cenário continua indefinido. Segundo ele, dois países servem de referência para o comitê: Austrália e Canada. Neles, os bancos centrais tiveram de retomar a alta nas taxas de juros depois que o processo de queda da inflação se mostrou mais lento do que o esperado.
Outra questão que pode ter pesado na decisão do Copom é o
risco de o arcabouço fiscal sofrer uma desidratação adicional. No Senado, foram
retirados do limite de gastos as despesas da União com o Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da
Educação (Fundeb), com o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) e com
as áreas de ciência, tecnologia e inovação.
“A retirada de rubricas importantes do limite de gastos deve pesar negativamente sobre as trajetórias tanto da dívida pública como da inflação”, destaca Nishio.