Não há como negar que 2022 foi um ano difícil para o mercado tecnológico, em especial para a Tesla. Após seu pico, em novembro de 2021, a empresa sofreu uma desvalorização de quase US$ 700 bilhões, ou R$ 3,6 trilhões na cotação atual. E 2023 começou em ritmo de queda. Na primeira semana do ano, as ações da montadora de carros elétricos caíram 12% — o pior desempenho em mais de dois anos. E apesar de ter tido uma leve alta nesta quarta-feira (18), o cenário para 2023 ainda é desanimador.
Muito se fala sobre a influência de Elon Musk, CEO da empresa automotiva, sobre a imagem da Tesla para o mercado financeiro. Desde a figura de gênio disruptivo até suas atitudes inconsequentes, a figura de Musk tanto já ajudou quanto atrapalhou a empresa. Vale ressaltar que o último ano também não foi dos melhores para o bilionário sul-africano, que bateu o recorde por perder cerca de R$ 1 trilhão em patrimônio pessoal líquido — deixando o posto de homem mais rico do mundo.
Desde que o executivo adquiriu o Twitter e assumiu a sua direção, os acionistas da Tesla ficaram preocupados com Musk estar gastando muito tempo com a rede social, enquanto a montadora sofre com um mercado cada vez mais competitivo. Outro motivo de insatisfação por parte dos investidores foi o bilionário ter vendido ações da Tesla para pagar a aquisição de US$ 44 bilhões do Twitter. Desde que a Tesla atingiu o seu pico, Musk já vendeu mais de US$ 39 bilhões (R$ 207,3 bi) em ações.
Desvalorização vai além da relação de Musk com o Twitter
No entanto, os últimos acontecimentos apontam que a situação da Tesla vai muito além de sua competição pela atenção de Musk com o Twitter. Problemas na produção dos veículos em fábricas da China, processos criminais em relação ao piloto automático, promessas vazias e a ameaça de uma recessão iminente causaram temores no mercado que não serão resolvidos caso Elon renuncie ao cargo de CEO da rede social.
As perspectivas de vendas e lucros da Tesla foram colocadas em xeque, desde que a empresa anunciou uma redução no valor de alguns de seus veículos no último fim de ano. “A Tesla está claramente começando a ver queda na demanda na China e nos EUA em um momento em que a concorrência está aumentando em todos os setores”, disse Dan Ives, analista de tecnologia da Wedbush Securities para a CNN.
O real valor da Tesla
Especialistas apontam que parte do problema com as ações da empresa é que a Tesla se vendeu como uma empresa de tecnologia disruptiva para os investidores e não como uma montadora. Dessa maneira, críticos se perguntam se em algum momento a companhia valeu a avaliação de trilhões de dólares que ela possuía no início de 2022.
Durante o seu auge, a Tesla chegou a valer o equivalente as 12 maiores montadoras atuais juntas — apesar de possuir apenas uma fração das vendas de qualquer uma delas. A empresa havia projetado uma meta de crescimento das vendas em 50% ao ano, o que ajudou a impulsionar essa avaliação. No entanto, a companhia admitiu em outubro que não atingiria o objetivo até o fim de 2022.
As ações da empresa ascenderam de maneira acelerada, chegando a uma valorização de cerca de 743% apenas em 2020, devido à reputação de Musk como gênio que revolucionaria a indústria automobilística. “A Tesla era vista como uma empresa de tecnologia disruptiva, não como uma montadora, e grande parte desse prêmio está relacionado a Musk”, destacou Ives.
Promessas vazias
No entanto, como pode ser observado, a empresa não cumpriu a maioria das promessas de Elon Musk e, além disso, não está conseguindo acompanhar os concorrentes.
Um dos principais exemplos é o Cybertruck, picape da Tesla, anunciada há três anos com previsão de ser produzida em 2021 — promessa que até hoje ainda não entrou em vigor. Por outro lado, Ford e Rivian possuem veículos do tipo já disponíveis para compra, mesmo tendo sido anunciados depois. A General Motors (GM) também já possui ofertas planejadas para o segmento de picapes elétricas.
“Elon Musk tem um problema patológico com a verdade”, reflete Gordon Johnson, um dos maiores críticos da Tesla entre os analistas, à CNN. Ele afirma que as ações da empresa não irão parar de cair até que a montadora seja precificada pelo que é e não pelas promessas de Musk. “Quando as pessoas dizem que ele é um gênio e inovador, é com base em todas as suas promessas que ele nunca cumpre”, adicionou.
Problemas na produção atrapalham o desempenho da fabricante
Segundo Johnson, para a Tesla atingir suas metas de crescimento, será preciso construir novas fábricas quase todos os anos. No entanto, as novas montadoras na Alemanha e no Texas que abriram no ano passado ainda não estão operando em sua capacidade total. As restrições contra a Covid-19 nas fábricas chinesas também reduziram a produção.
“A demanda nos EUA entrou em colapso. Há dois meses, o tempo de espera era de dois ou três meses. Agora, você pode obter um [carro] imediatamente. Eles vão construir mais carros do que vender pelo terceiro trimestre consecutivo. É a definição de excesso de capacidade”, explicou o especialista.
A Tesla agora possui grandes concorrentes, como a BYD, na China, Ford e GM.
Recessão nos Estados Unidos
Uma reportagem do Wall Street Journal aponta que dois a cada três economistas preveem uma recessão econômica se aproximando nos Estados Unidos ainda neste ano. Um dos principais motivos é as taxas cada vez mais elevadas para tentar desacelerar a economia e conter a inflação. Desemprego em alta, mercado imobiliário em queda e bancos dificultando o acesso ao crédito.
Diante deste cenário, os principais mercados a serem atingidos é o imobiliário e o automobilístico. Na primeira quinzena de janeiro, a Berkshire Hathaway, empresa de Warren Buffett, vendeu um milhão de ações na montadora elétrica chinesa BYD, concorrente da Tesla. O movimento trouxe ao mercado o receio de uma guerra de preços na indústria de carros elétricos, em meio à demanda mais fraca no maior mercado automotivo do mundo.
Ações da Tesla sobem 3,74% nesta quarta-feira (18)
Nesta quarta-feira (18), as ações da Tesla dispararam em Xangai, impulsionadas pelo corte no preço de seus principais modelos na China. Na Nasdaq, o crescimento foi de 3,74%, antes da abertura dos negócios, cotadas a US$ 136,40 (R$ 705). A alta das vendas no mercado chinês levou os carros elétricos a alcançarem a marca de 10% das vendas globais de automóveis.
No entanto, é importante ressaltar que o crescimento destoa da situação geral do mercado de automóveis, que está exposto à alta da inflação, preocupações com a Guerra da Ucrânia, cadeia de suprimentos e pausas na produção devido às restrições de covid-19. Dados da LMC Data apontam que as vendas totais de carros novos caíram cerca de 1% em 2022, registrando uma queda de 8% nos Estados Unidos e 7% na Europa.