Impactos da transformação digital e da matriz energética no setor de óleo e gás

A indústria de petróleo e gás vivencia os impactos simultâneos da transformação digital e das mudanças da matriz energética impostas pela necessidade de reduzir a emissão de gases de efeito estufa, por meio de combustíveis de fontes mais limpas e renováveis. No Brasil, também deverá ter reflexos no setor a promulgação da lei do gás (nº 14.134, de 2021) e a regulamentação desta pelo Governo Federal que objetivam aumentar a concorrência, atrair novos investidores e reduzir os custos de produção e o preço final.

Quanto às novas tecnologias no setor, que é regulado pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), destaca-se o digital twin (gêmeo digital), chave comum para impactos tecnológicos como internet das coisas (IoT), inteligência artificial (AI) e aprendizado de máquina (machine learning). Mudou a maneira como as empresas poderão desenvolver, avaliar e aprimorar produtos e processos. Trata-se da réplica digital fiel a um objeto físico, capaz de fornecer todos os prismas e dados relevantes a respeito da utilização do produto, por meio da qual projetistas e engenheiros conseguem dimensionar com exatidão como será o resultado de certo projeto e todo o ciclo de vida.

A internet das coisas, na área de óleo e gás, integra softwares para análise de dados a dispositivos com sensores acoplados, automatiza processos, antes manuais, em tempo real, supervisiona a distância diferentes etapas da cadeia de produção e eleva a segurança do setor, desde a extração até a distribuição.

Da análise da implementação da internet das coisas aplicada a óleo e gás ao redor do mundo, verifica-se que a América do Norte está à frente em comparação às demais regiões, em razão do volume de investimentos já feitos. O mercado europeu, por sua vez, aplica essas tecnologias há anos e pretende investir cada vez mais, especialmente nos países da Europa Central, que contam com o apoio dos governos a esse tipo de inovação, em conjunto com a iniciativa privada.

O mercado para a indústria de óleo e gás mostra-se em constante crescimento, sobretudo, em razão do desenvolvimento de economias locais importantes, como Singapura, Índia e Malásia. A inteligência artificial e o aprendizado de máquina têm sido utilizados no processamento da alta quantidade de dados, para que novas soluções sejam alcançadas pelas empresas, bem como que se possa, pela adoção de plataformas de computação em nuvem, manejar melhor os gastos energéticos na cadeia e na manutenção de equipamentos.

A necessidade de mão de obra qualificada é oportunidade de desenvolvimento da indústria brasileira no setor. A formação de trabalhadores especializados é tarefa de médio e longo prazos que não acompanha ainda o ritmo de evolução das metas de aumento da produção. Mesmo empregando cerca de 400 mil pessoas no país, com salários em torno de quatro vezes maior do que a média nacional, a indústria de óleo e gás enfrenta problemas devido à insuficiência de trabalhadores aptos ao exercício das funções exigidas, em especial pela introdução constante de novas tecnologias.

Conforme o Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), estima-se que a próxima década será decisiva para o setor, por representar o que pode ser a última janela de investimentos para atender ao pico da demanda global por energia não renovável, prevista para os anos de 2030. O IBP calcula, ainda, que o Brasil possui reserva não descoberta de 176 milhões de barris de óleo equivalente (boe = petróleo e gás). Até então, no entanto, somente 21 bilhões de boe foram extraídos da terra e do mar e apenas 15 bilhões possuem reservas provadas, no aguardo de oportunidades para que as atividades de extração sejam iniciadas.

No Brasil, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já estabeleceu procedimentos e condições para realização de atividades de recarga de veículos elétricos. Segundo a AIE, a infraestrutura para recarga de bateria para veículos elétricos está em expansão. Em 2019, já havia cerca de 7,3 milhões de carregadores ao redor do mundo, dos quais cerca de 6,5 milhões eram privados, a maior parte deles na China, seguida pelos Estados Unidos e União Europeia.

Até mesmo produtores da indústria de óleo e gás já vêm adotando medidas para alterar a fonte energética das instalações para outras sustentáveis, como os biocombustíveis. Muitos estão investindo inclusive em novas fontes de receitas mais limpas para diversificar seus portfólios de ativos que não sejam compatíveis com políticas de meio ambiente, social e governança regulatória. Esse movimento poderá gerar novas oportunidades de negócios para o segmento. No Brasil, já existem incentivos tributários para utilização de automóveis elétricos e híbridos. À medida que custos de produção de veículos movidos a energias limpas diminuírem, a tendência é que aumente o número de consumidores.

Como se observa, a transformação digital e as exigências relativas à mitigação da emissão de carbono estão provocando rápidas mudanças no mercado de óleo e gás e no seu marco regulatório. Nesse processo, há muitas oportunidades de investimentos. Por isso, é fundamental estar atento aos movimentos para não perder o trem da história.

(*) Marcelo Ribeiro é sócio líder de regulação da KPMG.

(*) Rodrigo de Lima Sampaio é diretor acadêmico e professor titular do CEU Law School.

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