Data da “falsa abolição”, 13 de Maio é dia de reflexão contra racismo no País

Assinatura da Lei Áurea é vista como manobra política, econômica e manteve negros em condições precárias

Andréia entrega panfletos na rua: “Nós, pretos, continuamos escravizados”. (Foto: Henrique Kawaminami)

Olhe à sua volta nos restaurantes, nos consultórios, nas agências bancárias, nas universidades: quantos negros são proprietários, médicos, gerentes ou professores? Quantos estão limpando esses lugares? Se a proporção da segunda posição é maior, isso é herança viva da “falsa abolição” perpetuada e que já foi celebrada no dia 13 de Maio.

Hoje, a data, ainda presente no imaginário da população, é usada pela comunidade e pesquisadores como dia de reflexão sobre as reais e duras condições de vida ainda imposta aos negros.

Formando 55% da população brasileira, os negros também são maioria nos postos de trabalho com salários mais baixos, mais precarizados e estão entre as principais vítimas de morte violenta no País. Em MS, o índice de negros é acima da média nacional (artea abaixo).

Aula na Escola Estadual Joaquim Murtinho sobre "Democracia Racial". (Foto: Henrique Kawaminami)
Aula na Escola Estadual Joaquim Murtinho sobre “Democracia Racial”. (Foto: Henrique Kawaminami)

“O 13 de Maio não foi abolição completa, ela foi inacabada”, explica a professora da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Eugenia Portela, coordenadora do NEAB (Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros). “Não houve política de integração os negros na sociedade, saíram das fazendas, dos locais onde foram escravizados sem direito a nada”.

Em material divulgado pela CUT (Central Única dos Trabalhadores), a secretária-adjunta da de Combate ao Racismo da CUT, Rosana Sousa Fernandes, também trata do tema e fala que a abolição liberou os escravizados, mas não trouxe nenhum tipo de reparação pelos quase 300 anos anteriores de escravidão. Havia movimento de libertação, vindo de fora, já que o Brasil foi último país das Américas a abolir a escravatura.

O capitalismo também foi fator preponderante para a abolição. “À época, chegavam os primeiros imigrantes italianos, portugueses e espanhóis, uma mão-de-obra branca que agradava à elite e favorecia o capitalismo”, disse Rosana. “A abolição foi mais uma forma de demonstrar que houve uma mulher branca, que foi benevolente com os negros e assinou a lei”, diz Rosana.

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 “Não há porque se comemorar o 13 de Maio”, enfatiza a coordenadora do Fórum Permanente das Entidades do Movimento Negro, Romilda Pizani. “Mas é um dia de conversamos sobre nossas lutas, significa olhar para o mercado de trabalho, para as salas de aula, para defasagem escolar, para saúde; nós da população negra estamos inseridos em todos os segmentos na sociedade, mas não somos atendidos nas especificidades”.

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Educação – Os pesquisadores citam a Lei 10.639/2003 como conquista, ainda lenta para ressignificar a data e valorizar outros aspectos da cultura e da história afro-brasileira. Também foi a lei que inclui no calendário o dia 20 de Novembro como “Dia Nacional da Consciência Negra”, este, sim, celebrado pela comunidade.

Andreia entrega panfletos na rua: "que chances eu tenho entrevista de emprego?". (Foto: Henrique Kawaminami)
Andreia entrega panfletos na rua: “que chances eu tenho entrevista de emprego?”. (Foto: Henrique Kawaminami)

Eugenia Portela publicou o livro “Educação das Relações Étnico Raciais: Caminhos para a Descolonização do Currículo Escolar”, que reúne cinco anos de pesquisa sobre o ensno nas escolas públicas estaduais de MS. “A implementação da lei e a desconstrução do 13 de Maio ainda está incipiente no currículo das escolas”.

Um exemplo de ação desenvolvida em MS está na Escola Estadual Joaquim Murtinho, em Campo Grande. O projeto Diversidade Étnico-Racial e Cultural é realizado há 16 anos, durante todo o ano e finalizado em novembro, no mês da Consciência Negra.

Hoje, alunos participaram da aula que faz parte da disciplina Itinerário Científico-Educação para Relações Étnico Raciais. O tema nesta sexta foi “Democracia Racial no Brasil”. A professora Luciana Claudia Zambillo diz que é importante para alunos conseguirem entender os temas que fazem parte do cotidiano de muitos deles. “O resultado final, aqui é, acabar ou desconstruir historicamente o preconceito”.

Larissa fala sobre racismo em aula e contexto social. (Foto: Henrique Kawaminami)
Larissa fala sobre racismo em aula e contexto social. (Foto: Henrique Kawaminami)

A acadêmica de História da UFMS, Larissa Duarte, era responsável pela aula de hoje. “A gente tem que refletir quais são as consequências da abolição, quais condições de trabalho vivemos hoje? Você não é mais escravizado, mas, mantém-se o contexto social e isso é o racismo estrutural”.

Chances – A desigualdade tratada nas escolas é evidenciada nas ruas, para quem tiver a curiosidade de levantar os olhos.

Matheus Santos, 22 anos, nem se lembrava da data. “Eu estudei só até o 6º ano, não entendo de muita coisa, mas acho que não nada para comemorar mesmo, por mim, essa data pode continuar apagada”.

Andréia de Castro, 38 anos, trabalhava no centro de Campo Grande, entregando panfletos, quando foi questionada sobre o 13 de Maio. “Continuamos trabalhando como escravos, nós pretos, somos desvalorizados, até no salário. Se eu vou em uma entrevista de emprego, cheia de pessoas brancas, qual a chance de eu passar? Quase nenhuma”.

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