Conheça o “minicérebro” criado em laboratório capaz de jogar videogame e reagir ao ambiente

Uma equipe liderada por Brett Kagan, da Empresa Cortical Labs (dedicados a construir nova geração de chips de computador biológicos), afirmou em artigo publicado nesta quarta-feira (12), na revista Neuron, que 800 mil células cerebrais que vivem em um prato são sencientes e podem realizar tarefas direcionadas a objetivos – neste caso, o jogo de computador Pong, semelhante ao tênis, sucesso na década de 1970.

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Agora eles vão descobrir o que acontece quando seu “minicérebro” é afetado por medicamentos e álcool. “Mostramos que podemos interagir com neurônios biológicos vivos de tal forma que os compele a modificar sua atividade, levando a algo que se assemelha à inteligência”, diz Kagan, diretor científico da Cortical Labs. Seus coautores são afiliados à Monash University, RMIT University, University College London e ao Canadian Institute for Advanced Research.

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“O ‘minicérebro’ oferece abordagem mais simples para testar como o cérebro funciona e obter informações sobre condições debilitantes, como epilepsia e demência”, diz o Dr. Hon Weng Chong, CEO da Cortical Labs.

Enquanto os cientistas há algum tempo são capazes de montar neurônios em matrizes de múltiplos eletrodos e ler sua atividade, esta é a primeira vez que as células são estimuladas de maneira estruturada e significativa.

“No passado, os modelos do cérebro foram desenvolvidos de acordo com a forma como os cientistas da computação pensam que o cérebro pode funcionar”, disse Kagan. “Isso geralmente é baseado em nossa compreensão atual de tecnologia da informação, como computação de silício. Mas, na verdade, não entendemos realmente como o cérebro funciona.”

Ao construir um cérebro modelo vivo a partir de estruturas básicas dessa maneira, os cientistas poderão experimentar usando a função cerebral real, em vez de modelos análogos falhos, como um computador.

Kagan e sua equipe, por exemplo, farão o próximo experimento para ver qual efeito o álcool tem quando introduzido no “minicérebro”.

“Estamos tentando criar curva de dose-resposta com o etanol – basicamente deixá-los ‘bêbados’ e ver se eles jogam o jogo com menos perspicácia, assim como quando as pessoas bebem”, contou Kagan.

Isso potencialmente abre a porta para maneiras completamente novas de entender o que está acontecendo com o cérebro.

“Esta nova capacidade de ensinar as culturas de células a realizar tarefa na qual exibem senciência – controlando a raquete para devolver a bola via sensoriamento – abre novas possibilidades de descoberta que terão consequências de longo alcance para a tecnologia, a saúde e a sociedade”, explicou Adeel Razi, diretor do Laboratório de Neurociência Computacional e de Sistemas da Monash University.

“Sabemos que nossos cérebros têm a vantagem evolutiva de serem ajustados ao longo de centenas de milhões de anos para a sobrevivência. Agora, parece que temos ao nosso alcance onde podemos aproveitar essa inteligência biológica incrivelmente poderosa e barata.”

As descobertas também levantam a possibilidade de criar alternativa aos testes em animais ao investigar como novos medicamentos ou terapias genéticas respondem a esses ambientes dinâmicos.

“Também mostramos que podemos modificar a estimulação com base em como as células mudam seu comportamento e fazem isso em circuito fechado em tempo real”, afirmou Kagan.

Para realizar o experimento, a equipe de pesquisa pegou células de camundongos de cérebros embrionários, bem como algumas células cerebrais humanas derivadas de células-tronco e as cultivaram em cima de matrizes de microeletrodos que poderiam estimulá-las e ler sua atividade.

Eletrodos à esquerda e à direita de uma matriz foram disparados para dizer ao “minicérebro” de que lado a bola estava, enquanto a distância da raquete era indicada pela frequência dos sinais. O feedback dos eletrodos ensinou o experimento a devolver a bola, fazendo com que as células agissem como se fossem a raquete.

“Nunca antes pudemos ver como as células agem em um ambiente virtual. Conseguimos construir ambiente de circuito fechado que pode ler o que está acontecendo nas células, estimulá-las com informações significativas e, em seguida, alterar as células de maneira interativa para que possam realmente alterar umas às outras”, comemorou Kagan.

“O aspecto bonito e pioneiro deste trabalho está em equipar os neurônios com sensações – o feedback – e, crucialmente, a capacidade de agir em seu mundo”, diz o coautor do professor Karl Friston, neurocientista teórico da UCL, em Londres, na Inglaterra.

“Notavelmente, as culturas aprenderam como tornar seu mundo mais previsível agindo sobre ele. Isso é notável, porque você não pode ensinar esse tipo de auto-organização. Simplesmente porque – ao contrário de um animal de estimação – esses ‘minicérebros’ não têm senso de recompensa e punição”, disse.

“O potencial de tradução deste trabalho é realmente empolgante. Significa que não precisamos nos preocupar em criar ‘gêmeos digitais’ para testar intervenções terapêuticas. Agora temos, a princípio, a ‘caixa de areia’ biomimética definitiva para testar os efeitos de drogas e variantes genéticas – uma caixa de areia constituída exatamente pelos mesmos elementos de computação (neuronais) encontrados em seu cérebro e no meu”, completou.

“Enfrentamos um desafio quando estávamos trabalhando em como instruir as células a seguir um determinado caminho. Não temos acesso direto a sistemas de dopamina ou qualquer outra coisa que possamos usar para fornecer incentivos específicos em tempo real, então tivemos que ir um nível mais profundo do que o professor Friston trabalha: Entropia da informação – nível fundamental de informação sobre como o sistema pode se auto-organizar para interagir com seu ambiente no nível físico”.

“O princípio da energia livre propõe que as células neste nível tentem minimizar a imprevisibilidade em seu ambiente.”

Drs. Kagan (sentado) e Weng (em pé) realizando trabalho celular em matrizes de multieletrodos em uma coifa de biossegurança (Imagem: Divulgação/Cortical Labs)

Kagan diz que uma descoberta emocionante foi que o “minicérebro” não se comportou como sistemas baseados em silício. “Quando apresentamos informações estruturadas a neurônios desencarnados, vimos que eles mudaram sua atividade de maneira muito consistente com eles realmente se comportando como sistema dinâmico”, contou ele.

“Por exemplo, a capacidade dos neurônios de mudar e adaptar sua atividade como resultado da experiência aumenta com o tempo, consistente com o que vemos com a taxa de aprendizado das células.”

Já Chong diz que ficou empolgado com a descoberta, mas foi apenas o começo. “Este é território novo e virgem. Queremos que mais pessoas participem e colaborem para usar o sistema que construímos de modo a explorar ainda mais essa nova área da ciência”, afirmou.

Com informações de Medical Xpress e BBC

Imagem destacada: Divulgação/Cortical Labs

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Fonte: Olhar Digital

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